quarta-feira, 18 de julho de 2012

Coro de Cidadão desta Atenas,


Vinte e cinco séculos passaram desde que Ésquilo, insatisfeito com a vida que os atenienses tinham de suportar, marcada pela angústia e pelo terror, escreve a Oresteia, numa época que aspirava a ordem mas que se movia no mistério e no medo, num mundo onde reinava a violência. Ésquilo inquietava-se, protestava se for preciso, e este protesto leva a uma aspiração da justiça. A Oresteia é mais um protesto de Ésquilo e dos Cidadãos de Atenas.

Ao longo das três peças que compõe a Oresteia (Agamémnon, Coéforas e Euménides) esta justiça, que começa por ser divina por isso temida, é desejada e reivindicada e por fim retocada e humanizada. Este é verdadeiramente o propósito de Ésquilo que não se contenta com um otimismo simplista, mas procura uma ordem, um ideal cívico e uma certa imagem de chefe digno.

Vinte e cinto séculos passados e nada mudou. A nossa Hélade vive momentos tão difíceis como então, as nossas coéforas continuam subjugadas pela discriminação e abandono total, “vemo-nos gregos” para suportar os desígnios e infortúnios que deuses (que se consideram) maiores assim nos obrigam a suportar, e as euménides, representantes da justiça, sempre tardam a chegar.

Ésquilo era um artista (escrevia, encenava e interpretava), e aos artistas sempre foi incutido o dever e a responsabilidade de denunciar o subjugo que os οτύραννοι (os tiranos) e ο δεσπόται (os déspotas) impunham ao povo. Ésquilo fazer chegar ao espírito do espectador o sentido de uma sociedade mais humana e humanizada, justa e com igualdade de deveres e direitos…

Caros Cidadãos desta Atenas, não esperem que a Oresteia a que assistis seja apenas mais um espetáculo; mais um tema clássico que fica bem na programação do Theatro Circo. Não esperem chegar um pouco antes do espetáculo, comprar calmamente o bilhete e entrar na sala, e comodamente, sentados na plateia, assistir a um bonito clássico. Desenganem-se, o desconforto e o desassossego das Erínias esperam-vos e a qualquer momento estão prontos a atormentar-vos. É a certeza que vos posso garantir: que sereis vítimas, tal como outrora os nossos pais helénicos foram, de confrontos. Confronto entre as personagens, conforto com as personagens e confronto entre o teatro e a realidade, que todos pensa(va)m antiga mas no fundo tão presente…

… Senhores que conduzem mal os seus exércitos, que governam mal as suas cidades, que utilizam ilegitimamente o poder que lhes é confiado, estreitam relações e fazem novas alianças conforme lhes convém, que sacrificam jovens porque a necessidade exige uma atitude bélica como essa… Senhores que no fundo não desapareceram, apenas mudaram os rostos e os nomes…

«Se as grandes crises, como diz Jaqueline de Romilly, têm qualquer coisa de coletivo: por isso combina-se facilmente com o papel desempenhado pelo Coro» também a resolução desse problema passa pela prática da justiça, pela vinda de um Orestes que, mais do que vingar, vem restituir a ordem e fazer justiça!


                                                                                           Nuno Campos Monteiro
Universidade do Minho